domingo, 24 de fevereiro de 2008

Sobre a felicidade

Sim, sou um maldito filho da mãe muito do pretensioso para escrever algo com esse título, eu sei. Bom, não existem verdades absolutas, apenas pontos de vista, e esse, no dado momento, é o meu (embora sujeito a mudanças repentinas e imprevistas de opinião).
A questão, é que li hoje uma frase que dizia mais ou menos o seguinte: "Vocês não serão felizes depois que passarem no vestibular. Não serão felizes depois de conseguirem um emprego. Não serão felizes depois que se casarem. Não serão felizes depois de nada.".
Ahhhh!! Eu... Sempre perdido entre a dialética... Jamais conseguiria chegar numa afirmação tão economicamente certeira... Quem disse essas palavras não é um mero charlatão das idéias como eu, e sim, um verdadeiro filósofo.
Para quem realmente entendeu a frase citada, nem compensa ler o que escreverei. Mas para aqueles que perceberam nessa citação o mínimo de pessimismo – sim, ela é perigosa – penso que não a entenderam... Tentarei resumir um pouco minha opinião...
De fato, não se acha a felicidade num aumento de salário, não se acha a felicidade no final de semana, nas férias de verão, não se acha felicidade depois de se mudar para o bucólico e florido campo francês, entre vinícolas e montanhas enevoadas... O que se acha, talvez, é a oportunidade de vivê-la em mais momentos.
Sumariamente, o problema está na escolha do verbo. Gostam de usar o irregular e anômalo verbo ser (talvez por encararem a própria felicidade como irregular e anômala). Não. A felicidade está em outro plano de existência, em outra dimensão por assim dizer, onde cabe apenas outro verbo: estar.
Já repararam que a memória não é feita de dias, semanas, meses e etc., mas, sim, de momentos?! Há uma enorme diferença... Você não se lembra daquele exato dia das férias julianas de 1997, e sim, de lapsos de momentos daquele dia, semana, mês... Momentos que, juntados aos pedaços, constituem o mural de lembranças que se encontra fundo em sua mente, e, até mesmo (por que não?!) que constituem você próprio. A felicidade segue o mesmo padrão da memória...
As pessoas tendem a programar e colocar a felicidade encaixada numa grade de horário; reservam um ou dois dias da semana, um ou dois meses do ano para a felicidade... Tudo errado!
Não se é feliz num sábado à noite, numa manhã de um feriado ensolarado, não. Não se é feliz depois do vestibular, casamento, (...). Se é feliz no sorriso de um ilustre desconhecido, se é feliz no vislumbre da graciosidade de um beija-flor, se é feliz nos breves minuto em que se vê o feixe de raios de sol conferir às copas das árvores um quê de celestial, se é feliz ao ler um livro, escutar uma música, se é feliz na gargalhada ébria de um alguém amado...
Não se é feliz - ou se está ou não se está feliz. E o fato de que na maior parte do tempo não se está sentindo necessariamente feliz, ou indiferente, não quer dizer nada. Se se consegue ponderar uma semana de trabalho inútil e alienante com momentos de desilusão humana, vazio existencial e um belo par de sorrisos sinceros, então isso já é algo de valor.
E não, não estou sentado no conforto conformado de alguém que não espera muito da vida, pelo contrário, até me definiria como alguém que nunca se satisfaz, nunca. A angústia também muitas vezes chega a consumir um pouco de minha vitalidade – o espírito humano é voraz (e só eu sei o tanto que o meu é...), como já escrevi antes (no texto Arroto), a mente humana e sua complexidade de idéias, anseios, pensamentos e etc., é totalmente incompatível com a estupidez e “ordinariedade” da vida. Há de se procurar um ponto de equilíbrio – não que eu já tenha achado o meu, até porque existe um ditado inglês que diz as sábias palavras “the chase is better than the catch”...
A felicidade é algo muito pessoal, um reflexo de anos de experiências pessoais acumuladas durante a vida, de cada característica própria. Em outras palavras, deculpem-me o termo, a felicidade é igual a bunda, cada um tem a sua – e de vez em quando ela pode feder.
Antes de julgá-la escassa, rara, ou até mesmo duvidar de sua existência, deve-se ao menos tentar entender a peculiar natureza do que significa “felicidade”, sua relatividade... Sim, você não será feliz depois que passar no vestibular, não será feliz depois de conseguir um emprego, não será feliz depois que se casar, não será feliz depois de nada... Porque seria impossível ser feliz - se menospreza uma das coisas sobre a qual tudo que há gira: a relatividade. Obs.: Já pensou o tanto que é ridícula e impossível a existência daquilo que os cristãos chamam de “paraíso”?! Isso segue o mesmo raciocínio...
Felicidade... Não a confunda com aquilo que tentam lhe vender diariamente num anúncio de jornal, não a confunda com um comercial da colgate...

4 comentários:

liessa disse...

Oi, Thomas!

Sem rumo por cá, pairei sobre teus ensaios e fiquei com uma linha na mente.. O traçado é que não é pretensioso falar sobre felicidade.O gérmen- e o fim- das religiões está na felicidade.Inquietação e sossego, finalidade e perdição.. Divagar sobre é tão humano quanto perceber a risada. Haja filosofias tantas, elas mesmas vão se criar para serem contraditas pois se a felicidade é uma crença social, uma vez decifrada a comandos químicos e manipuláveis, vão criar outras fontes de busca. A (in)felicidade não morrerá, isso é certo.
O alívio para a melancolia em doses homeopáticas depressivas.
Coisas contraditórias da essência humana.

Gustavo Jaime disse...

Frívola felicidade

Essa perseguição pela felicidade
Ainda vai nos fazer chorar
Ninguém é
Ou vai ser
Um completo feliz
Desejamos por decreto
Sem perceber ao certo
E sem encarar de frente
A infelicidade
O que é ser feliz e satisfeito
Senão a roupa da moda
O tênis bacana, o carro perfeito?

Eu não tenho a pretensão
De distribuir alegria vã
E animar platéias
Eu não persigo uma felicidade tola
Baseada em conquistas frívolas
Até o amor, a paixão, os sentimentos
Vejam só!
Foram enfileirados em prateleiras
Nossas mais densas sensações
Viraram bens de consumo e serviço
Que infeliz o quê?
Isso é proibido no mercado do sorriso

Mas eu não quero essa tal felicidade
Estampada nos contos de fadas
Quero a naturalidade e nada mais
Justa e tenaz

Hugo Vaz disse...

Boa Mamonas, isso já deveria ter entrado na pauta da teoria Wide Boys - até agora só a experienciei na prática. Vai aí um versinho a là budista que escrevi agora pra te parabenizar pelos textos - e pelo blog, so far. Abraxxx.

"Sim, tu segues rompante
Durrubando as paredes
E um dia, sobre tua cabeça,
o teto há de cair".

Hugo Vaz disse...

velho, voltei aqui pra deixar uma dica: o blog do Che. Apesar de não ser extenso, tudo que tá lá vale a pena. O endereço é ladraodepiano.blogspot.etc. Enjoy!